Fardo: É meu lugar bicho, sai daí...

Não tem jeito... É sempre a mesma coisa de sempre. Sempre que o ônibus está lotado alguém senta comigo, sempre... Sempre nessa ocasião, porque senão...
Já faz uns dois anos que eu nas viagens de ida e volta para a faculdade procuro sentar sempre no mesmo lugar, não só eu, como a maioria, acho...
Herdei esse lugar do Renato que fazia não faculdade, mas um curso técnico de informática em Jales. Atrás de mim senta o Luizão e André, na frente acreditem, nunca reparei. Cheguei como quem não quer nada, e peguei o lugar assim que descobri que o Renato acabará o curso, meio ressabiado, pois o lugar é quase no "fundão" não no "fundão", mas pode-se dizer "humildemente" que faz parte do mesmo, fiquei ali na minha, meio em jeito, se alguém sentasse junto com o Renato teria agora que dividir lugar comigo. Sujeito de pouca conversa com quem não tem afinidade, possivelmente por esse motivo nos primeiros dias fui eu sozinho no lugar, sem ninguém. O lugar é muito do "ajeitadinho", tem uma janela na qual quando se esta com calor pode abrir, na verdade tem duas, mas se abrir uma das, faz uma barulheira danada, então só pode abrir uma delas (detalhe, somente quem senta ali sabe disso), tem "cortininha" para que o sol não torre o rosto no horário de verão, e... o mais importante... fica do lado da caixa de som, um horror, principalmente nas noites que não levo discman, ai a felicidade esta completa.
Claro que volta e meia um desavisado senta no meu lugar e lá fica, mas como não sou a favor do "esse é meu lugar", nem ligo, também sei que é só por uma noite... ou duas... Passado isso, lá estou eu de volta ao meu "lugarzinho", ano passado tinha um buraco enorme do lado, onde meu discman quase se perde, por sorte segurei. Esse ano, nem o buraco mais têm o motorista e dono do ônibus, o "Marquinho" se deu o trabalho de tapar com fita adesiva, santo homem, perder meu precioso e velho discman ali seria uma dor de cabeça enorme.
São muitos os momentos que eu passo no meu lugar, várias são as "paisagens", certa vez achei até que conhecia cada "vaquinha" de tal pasto. Nunca se sabe... quem se atreve a dizer que não? Ah... tem outro detalhe primordial do meu "lugarzinho"... Mas vamos deixar, esse é melhor eu nem comentar...
Porém, como tudo na vida tem seu carma, o grande problema são os bichos... Não insetos, mas os calouros, esses sim, entram no ônibus e vão logo sentando, não querem nem saber... ano passado foi assim, no começo do ano quase não tive contato com meu lugar, mas logo com muito pensamento positivo, muita fé, eu o consegui de volta. Mas esse ano ta difícil, pelo menos mais que no ano passado... Pelo menos até agora, o povo teima em pegar meu "lugarzinho". Pra ser sincero agora estou sentando mais nele. Pois pudera...
O nosso grande presidente "transrroviário" decidiu (se decidiu está decidido) que, as pessoas terão seus lugares fixos. Isso... Nada de ficar mudando de lugar todo santo dia. A votação? Claro... Não teve!!! Decidiu ta decidido... Mas vejamos pelo lado bom... Com tal LEI, eu agora vou ter meu lugar de volta, e só pra mim, sem nenhum bicho chato pra me encher. Sou contra tal LEI, mas fazer o que...

O lugar é meu e eu tiro quem sentar...
Dúvida? Pergunta pra menina que sentou nele...
Não sei se era bicha, se era do outro ônibus, se era espiã, não sei o nome, muito menos o sobrenome. Só sei que um dia lá em Jales na hora de vir embora, eu subo no "busão", calmo, pensando no discman como sempre e quando vejo... A dita cuja mete a bolsa no meu "lugarzinho" e, quando já ia saindo bate de frente comigo. "Esse lugar é meu, sento ai faz uns dois anos", Ela: "Mas eu vim nele", Eu: "Veio hoje e eu há anos", Ela: "Você tem razão, vim no de trás". Ao dizer tal frase, o André entra em cena: "V... ve... veio nada, eu vim", Ela: "Ahhh... ééé... Eu era no da frente mesmo.", confusa ela. Eu: "Que o que, na frente sou eu...". Na tentativa dela sentar no lugar do André eu tomei o meu. Tenho plena noção que isso não se faz com uma mulher, esta totalmente fora de minhas qualidades, mas como disse a ela, tal lei não havia sido inventada por mim, muito menos votada, era contra tal fato, mas se assim era, assim ia ser... Ela em uma última tentativa: "Você vai ficar ai mesmo?". Tive dó: "Vou... mas vamos fazer o seguinte, você quer sentar em um lugar com sua amiga não é (notei que ela segurava dois materiais escolares)? Caso você ache um lugar disponível para mim, eu troco com você.", nem deu moral, saiu que saiu ventando, praticamente me xingando em pensamentos. E eu que ia abrir mão do meu amado "lugarzinho" com todas suas qualidades, pra dar a ela, ingrata. Mas assim iria ser...
De nada adiantou, no outro dia tinha uma "cabeçuda" no meu lugar de novo. Mas não vou desistir... Pensamento positivo, sempre...
A luta ainda continua ontem mesmo eu sentei no meu "lugarzinho", acompanhado de uma menina, que eu também não sei o nome, não que seja péssimo de guardar nomes, é que não conheço mesmo. Fui e voltei com ela. Notei que volta e meia na ida e na volta ela se remexia, virava pra cá, pra lá, mostrava a língua, incomodada? Hoje... Hoje, acabo de chegar da faculdade, e no meio do caminho vim pensando, após ter notado que ninguém sentara comigo na volta, acabei por chegar a uma conclusão. Acho que não sou muito amistoso, acho que o povo evita ao máximo sentar comigo, só quando está lotado mesmo que alguém e pobre desse alguém que tem que sentar comigo. Não tenho doença e não me acho fedido pelo menos eu não me acho, então por que me evitar? Hoje eu achei a resposta que procurava há anos, hoje descobri o porquê ninguém senta comigo. Só hoje...
O problema esta no discman. Deve ser um horror, bem melhor ir em pé, do que ir com um maluco que ao ouvir o primeiro barulho do motor, mete um discman nos ouvidos e fica com seus pensamentos a flor da pele. Não deve ser fácil para uma pessoa que levanta cedo ser obrigada a ouvir Chico Buarque ainda mais cantado por mim. Que horror... Que vergonha... Nos momentos de empolgação, quem esta do meu lado, certamente me ouve cantarolar trechos de canções do grande Chico, pra quem não gosta de Chico então, uma delicia. Canto de tudo depende do que Chico mandar, Futuros Amantes, Jorge Maravilha, Baioque, Mulheres de Atenas, tudo... Mas vou além...
Notei que quando começou a canção, Samba de Orly, eu me mexia como um doido será que eu estaria tentando sambar? Sei lá... Pra quem quer tirar uma soneca no caminho de volta da faculdade tento que aturar alguém cantando e possivelmente sambando, com minha voz e meu gingado é uma coisa horrenda demais. Só pode ser por isso que ninguém senta comigo...
Agora eu sei porque a moça que veio esses dias ao meu lado me olhava de rabo de olho, torcia o nariz, reclamava, acho que reclamava, pois estava com a cara fechada e movimentava os lábios, só agora eu sei o porque... certeza, ela não gosta de Chico...

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